Nos primórdios da aviação comercial quase não havia equipamentos automáticos nos aviões, tudo necessitava de comandos e controles manuais. O trabalho dos pilotos era árduo, por isso, em alguns aviões, eles podiam contar com o rádio telegrafista, que era um tripulante para operar o rádio HF, recebendo e transmindo mensagens em código Morse.
Com o aperfeiçoamento dos equipamentos de rádio e a ampliação da rede de antenas transmissoras em terra, a presença deste profissional passou a ser desnecessária. Outro que acabou perdendo o “emprego” para os sistemas automáticos foi o Navegador, que com conhecimentos de navegação astronômica, era uma pessoa fundamental nos vôos de longa duração.
Mas quando sistemas de navegação autônomos e automáticos foram incorporados aos equipamentos dos aviões, os pilotos perderam a ajuda do navegador.Por muitos anos o mecânico de voo pode ser visto em muitas das cabines de comando. Electra, Boeing 707, 727, Airbus A-300, DC-10 e o Jumbo 747-200 e 300 foram alguns dos aviões que a Varig operou e que os pilotos adoravam contar com a presença do F/E (flight engineer, ou mecânico de voo).
Novamente a evolução dos sistemas e equipamentos “desembarcou” mais um tripulante da cabine. Controle dos sistemas de ar condicionado e pressurização, combustível, sistemas elétricos e tantas outras atribuições que antes eram feitas pelo F/E, hoje é feita pelos pilotos através de equipamentos automáticos.
Quando em 89 eu deixei o A-300 para voar o 737-200, eu senti muito a falta do “terceiro tripulante” na cabine, pois como copiloto, passei a fazer tarefas que antes não eram de minha responsabilidade. Além da operação de equipamentos na cabine ainda tinha as inspeções externas, cálculos de performance, preenchimento de formulários e documentação de vôo para eu me preocupar! Os sistemas automáticos são fundamentais na aviação moderna, pois deixam os pilotos livres para voar o avião e gerenciar as situações que possam surgir, principalmente as eventuais anormalidades.
De todos os sistemas automáticos, o mais óbvio e prático no dia-a-dia é sem dúvida o piloto automático. O Bandeirante da Rio- Sul não possuía piloto automático, o voo era todo feito “na mão”. No Electra e no 737-200 o piloto automático não era tão moderno e eficiente, por isso pilotávamos na mão por um bom tempo, entregando a pilotagem a ele já próximo ao nível de cruzeiro.
Na aproximação era gostoso desligar o piloto automático e curtir a pilotagem. Hoje em dia o sistema de piloto automático é muito preciso e confiável, o que torna o voo mais eficiente, seguro e até mais econômico para as empresas aéreas. Seu uso é altamente recomendado em todas as circunstâncias, desde instantes após a decolagem até próximo ao pouso, sendo que há ocasiões em que um pouso automático deve ser realizado pelo piloto automático.
Meu filho costuma me dizer que eu não faço nada na cabine, pois é só ligar o piloto automático que ele faz tudo sozinho. E eu não me canso de dizer a ele que sem um piloto para operá-lo, ele é inútil.Ao mesmo tempo em que seu uso faz parte da rotina operacional, as empresas também recomendam que ocasionalmente, em condições de tempo bom, os pilotos exercitem a pilotagem “manual” sem o uso do piloto automático.
Recentemente em uma etapa de Congonhas para Curitiba (38 minutos de voo) eu fiz todo o voo “na mão”. Dá trabalho, principalmente porque além de pilotar, temos que manusear e estudar as cartas de procedimentos de subida e descida, além de manter os olhos constantemente nos instrumentos de voo. Qualquer movimentação de passageiros e tripulantes ao longo da cabine, uma tendência de nariz em cima ou embaixo vai ocorrer, e sem o piloto automático, cabe ao piloto estar atento as correções necessárias.
Na aproximação final para pouso, as correções para o efeito de vento devem ser cada vez mais precisas e rápidas na medida que a pista vai se aproximando. Há ainda a manutenção da rampa e da velocidade através do controle de potência dos motores. Não que seja uma tarefa difícil, mas a verdade é que com o uso diário do piloto automático, os pilotos acabam se desacostumando a voar na mão.
No final das contas, foi um voo tranquilo, a aproximação foi precisa e o pouso suave. Talvez daqui a um ano eu volte a realizar outra etapa (preferencialmente um voo curto) sem ligar o piloto automático. Até lá espero sempre poder contar com a fidelidade do Piloto Automático!
Comandante Beto Carvalho, aviador e piloto de grandes jatos
Um comentário:
Muito legal este tipo de postagem. Quero mais!
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