Vou começar contando uma historia das mais interessantes, que mostra como o destino usa você para fazer um bem ao semelhante que você nem conhece e que não tem nada com isto. Ainda bem que no meu caso foi para o bem, pois acredito que possa ser também para o mal, o que se for este o caso deus que me perdoe.
Esta história se passou em uma cidadezinha acima de São Félix do Araguaia, nas margens do Rio Araguaia, que não consigo lembrar o nome!
Vocês vão notar que as histórias que conto, não são minhas e sim do meu avião pois, ele sim merece uma homenagem pois por muitos anos fez historia, deu-me de comer, salvou-me varias vezes da morte certa, pois voava melhor que eu e muito, bastava eu tirar a mão do manche eu sentia que ele sim, tinha o dom de voar.
Confesso que esse dom eu nunca tive, eu sei quantas vezes ele não deixou que eu o quebrasse, pois talvez eu é que sairia quebrado. Esta historia é de muitos anos passados, quando o estado do Tocantins ainda era Goiás e Pará, e eu e minha família, vindos do estado de São Paulo, nos encantamos com aqueles varjões da Ilha do Bananal.
Junto com amigos, começamos a comprar um mundo de terra que acabou nos envolvendo num punhado de processos judiciais, que quase me enlouqueceram, obrigando-me a buscar meu amigo Nilton Soares, na cidade de Luciara (lembrei o nome!) para ser ouvido como minha testemunha!
Bem, esta história vai ser muito interessante, pois verão como um simples voo, foi capaz de salvar o romance de dois jovens analfabetos e totalmente apaixonados, e por incrível que pareça foi isto que determinou o rumo de suas vidas.
Estava eu todo encrencado com a justiça e necessitava de buscar um amigo que seria minha testemunha em Luciara, cidadezinha as margens do rio Araguaia .
Eu e meu irmão gêmeo Milton, (a semelhança não era só de nome não, era também física!), e não pensem que não usávamos isto na aviação, mas esta é historia para outro dia!
Pegamos logo cedo o velho PT-BNH e decolamos para nossa aventura. Cruzamos toda a Ilha do Bananal, e após uma hora de voo, chegamos em Luciara, pista boa, grande, larga, o piso lizinho, e, após o pouso, fomos logo procurar meu amigo.
Cidade pequena todo mundo sabe de tudo e logo informaram-me que meu amigo tinha acabado de pegar um barco para outra margem pois estaria indo para sua ilha. Corri então para fretar um barco e tentar alcançá-lo, mas, infelizmente não tinha nenhum disponível. Deparei-me então, com um jovem todo aflito, com o mesmo problema, querendo ir para a outra margem.
Voltei para o barzinho onde meu irmão me aguardava para dar a noticia quando encontrei um homem que, vendo meu sufoco, foi logo me dando uma idéia meio maluca: faça um bilhete, amarre em uma pedra, cubra com um plástico, faça com seu lenço um para-quedas, atravessem o Rio de avião e jogue o bilhete. Simples, não?
Claro! Fomos para o aeroporto decolamos ,meu irmão ficou incumbido de jogar o bilhete através da janela do avião e, quando chegamos na outra margem, lá estava meu amigo e junto com duas mulheres e mais uns três homens,que logo trataram de pegar o bilhete que jogamos!
Acenei para meu amigo, voltei para pista e fomos aguardá-lo, no único barzinho recomendável.
Algum tempo depois, avistei meu amigo vindo em minha direção todo alegre em me ver, que foi logo dizendo:
- “Uai,o que estão fazendo por aqui”? Não ouvi o barulho do avião porque estava dormindo na casa de meu compadre, a farra lá foi boa demais, ainda estou meio alto”!
- Mas xará, disse-lhe, não era voce que estava na ilha, quando eu joguei o bilhete pedindo-lhe para voltar, para ir-mos na audiência em Gurupi ?
- Não! disse-me ele! Eu estava dormindo!
- Que coisa estranha, eu jurava que tinha sido você. Mas, tudo bem, o que interessa, é que já te encontrei e quero que você vá comigo agora!
Como ele só poderia viajar no outro dia de manhã, tratamos de pegar um hotelzinho para dormir.
Por volta das 20 horas,estava sentado na pracinha em frente ao Hotel, quando chegou um camarada e foi dizendo:
- Veja só o que aconteceu com aquela minha prima, aquela que se juntou com o filho de seu Raimundo Nonato. O cabra não estava mais suportando aquela casca grossa e acabou entregando-a de volta para a família, só que quando eles ja estavam indo embora, o cabra se arrependeu, acabou fretando um avião e jogou um bilhete pedindo para ela voltar! E não é que voltaram,e se encontraram na beira do rio e foi aquela alegria, estão agora no maior dos amores!
- Espere aí, disse eu, esta história não está bem contada! Como fretou um avião se o único que está aqui em Luciara é o meu, de onde partiu o bilhete onde pedia para o Nilton Soares que voltasse para Luciara e nada tinha escrito sobre aqueles dois?
Imaginem só meus caros amigos: o que aconteceu na realidade é que quando estava por cima deles a moça jurava que quem estava dentro do avião era seu marido e que ele estava pedindo para que ela voltasse. Como todos ali eram analfabetos não puderam ler o bilhete, só consequiram ler o nome de Milton (na cidade tinha um piloto com este mesmo nome), e deduziram que era ele e com a persistência da guria em voltar, assim o fizeram e acabaram encontrando o marido desesperado aquardando-a na margem do rio.
Aí foi aquela alegria e só conseguiram entender todo o ocorrido, depois de acharem alguém que leu o bilhete inteiro e compreenderem que, na realidade, tinha acontecido uma boa ação involuntária quando, junto com meu avião, acabamos por contribuir para que aqueles jovens tivessem uma nova chance de vida!
Espero que ainda estejam juntos, pois uma coincidência desta, não deve voltar a ocorrer jamais, não é?
Comandante Niltinho Costa
é piloto de garimpo
Um comentário:
Simplesmente fantástica esta história! Parabéns ao Sr. Niltinho e a voce JC pela publicação.
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