Taiadablog: Quando uma profissão só não basta !!!

domingo, 3 de abril de 2011

Quando uma profissão só não basta !!!


  Em 1985, quando entrei para a aviação comercial, quase a totalidade dos pilotos da Varig eram apenas pilotos, até porque, muitos iniciaram cedo na profissão, antes mesmo de ter idade suficiente para concluir um curso superior. Uma excelente carreira que oferecia bons salários, promoções ao longo dos anos, estabilidade no emprego e uma ótima aposentadoria. No grupo de pilotos, era raro encontrar alguém que tivesse outra profissão além de aviador. Havia alguns comandantes que eram também advogados e outros poucos que possuíam algum tipo de comércio, mas a maioria vivia apenas de pilotar aviões e estar empregado na Varig (ou qualquer outra grande empresa) parecia bastar.
  Na minha turma de Evaer (Escola Varig de Aviação, que frequentávamos por certo período antes de voar uma das aeronaves da empresa), havia um colega dentista. Ele fechou o consultório e informou aos pacientes que estava encerrando as atividades para seguir carreira na Varig. Outro colega de turma era engenheiro, tendo inclusive trabalhado nas obras do “futuro” aeroporto de Guarulhos.
Com o passar dos anos este quadro sofreu mudanças. Muitos pilotos (e comissários também) passaram a fazer faculdade ou abrir pequenos negócios. Direito parecia ser a opção preferida, e quanto aos pequenos negócios, restaurantes, cafeterias e outros serviços estavam nos planos dos aeronautas. Alguns prosperaram nestas atividades paralelas, outros não.
    No começo da década de 90, surgiu em Porto Alegre o primeiro curso superior na área da aviação civil. Um convênio foi firmado entre a Varig e a PUC-RS, e assim, após ter formado quase a totalidade dos pilotos da Varig, a Evaer encerrou suas atividades. Nos anos seguintes os novos pilotos contratados pela Varig já eram formados em Ciências Aeronáuticas. Outras faculdades, além da PUC, criaram cursos similares na área da aviação civil, atraindo, inclusive, pilotos que já trabalhavam há anos nas empresas aéreas.
 Movidos por uma preocupação com o futuro, já que a crise na Varig (e também na Transbrasil e Vasp) se intensificava ano após ano, ou talvez por um desejo pessoal, cada vez mais aeronautas partiram em busca de uma segunda profissão. Muitos tripulantes se tornaram também advogados, arquitetos, psicólogos, fonoaudiólogos entre outras profissões. Mas a verdade é que são poucos os que conseguiram exercer estas atividades simultaneamente com a aviação. Um destes colegas, que já era formado em Ciências Aeronáuticas, conseguiu voar no quadro fixo da Ponte Aérea e após quatro anos se formou em Direito. Após passar nos exames da OAB e exercer a profissão junto com colegas da faculdade, ele se matriculou num curso superior de Gastronomia. Formou-se e continuou voando na Varig. Com o fim da “velha” Varig, ele se sentiu tranquilo, intensificando suas atividades de advogado. Mas ele sentiu falta da profissão de piloto, ao mesmo tempo em que foi se desencantando com o Direito. Após mais de um ano fora do mercado da aviação, foi contratado para voar de copiloto na Gol. Menos de um ano depois, foi voar em outra empresa, na Azul, onde em poucos meses foi promovido à função de comandante. Hoje ele exerce o cargo de instrutor, está feliz e nem sonha em voltar à atividade de advogado. Quanto à atividade de “chef de cuisine”, até onde eu sei, meu colega Muraca deixou de lado.
   Outro caso interessante é de um colega que depois dos 40 anos se formou em Direito. Até aí tudo bem, ser advogado parece ser a opção mais lógica para os pilotos, acontece que já depois dos 50 anos de idade ele cursou medicina veterinária! Está cheio de idéias para o futuro e enquanto pilota Boeing pelo Brasil afora, o Cmt. Barbosa Gomes faz planos para abrir um negócio no ramo veterinário.
   Há também o Cmt. Carlos Batista, que há anos exerce a atividade de psicólogo. Além de prestar serviços na área de recrutamento de pilotos, ele atende seus pacientes em consultório, sendo que neste caso, assim que recebe sua escala mensal de voos, ele abre a agenda para os pacientes.
Hoje em dia a aviação está repleta destes casos em que tripulantes que possuem outras atividades. Eu sou só piloto e muitas vezes acho que está faltando tempo no meu dia a dia para atividades de lazer ou para ficar tranquilo com minha mulher e filhos! Assim, admiro muito estes colegas que conseguem abrir mão do convívio familiar, se envolvendo em estudos e outras atividades além de sua profissão.
Duas fotos do Concorde que eu tirei de um livro ilustrado sobre a história dele. Na foto em que ele está estacionado no aeroporto de Los Angeles, aparece um outro avião. Adivinha de que empresa?
 
Comandante Beto Carvalho
É aviador e piloto dos grandes jatos

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