De acordo
com o Manual Enciclopédico do Café, o Japão foi um dos países que mais
resistiu à entrada dessa estimulante bebida entre seus hábitos
regulares. Tradicionalmente adeptos dos chás (o chá verde é a bebida
nacional japonesa há aproximadamente mil anos), foi apenas entre os
séculos XIX e XX que o café conseguiu conquistar algum espaço entre os
nipônicos.
Quando
surgiu enquanto alimento, os frutos do café eram assados em gordura e
comidos com açúcar. Foi apenas a partir do século XVI em diante, que
surgiu a infusão dos grãos na região do Oriente Médio. Mais recente
ainda é a utilização do café como fechamento de refeições, hábito
tipicamente brasileiro repassado para o resto do mundo.
Para que o
café possa se tornar a bebida que todos conhecem é necessário que passe
por um processamento que lhe permita ficar seco, depois torrado e
finalmente moído. Seu sabor final, diga-se de passagem, é definido pelo
tempo de torragem. Além de ser encontrado em grãos e moído, o café
também é disponibilizado em pó solúvel. Além
de consumido de diferentes formas enquanto bebida, o café é muitas
vezes utilizado como componente para a produção de sorvetes, tortas,
bolos e doces.
Entre as
diversas variações de café disponíveis no mundo para o consumo de seus
fiéis bebedores podemos destacar o expresso, o colonial, o cappuccino, o
brûlot, o vienense, o macchiato, o café com leite, o mocha, o hardy, o
escocês, o irlandês, o procope ou ainda o turco (que também responde
pelo nome de café grego).
Tendo
surgido enquanto bebida com grande destaque no cenário mundial
justamente no período em que efervesciam as idéias renascentistas, o
café foi adotado pelos intelectuais e maiores pensadores do racionalismo
e do iluminismo e continuou sendo popular entre as elites pensantes
européias em períodos posteriores da história.
Não são
poucos os depoimentos de ilustres escritores, políticos, filósofos,
cientistas e artistas em favor do consumo do café em virtude de suas
grandes qualidades. Honoré de Balzac, por exemplo, escreveu as seguintes
linhas sobre o café: “O café cai-nos no estômago e há imediatamente uma
comoção geral. As idéias começam a mover-se como os batalhões do Grande
Exército no terreno onde a batalha ocorre. As coisas que recordamos
surgem a todo o galope, de estandarte ao vento”.
As origens
do café remontam ao continente africano sendo originário
especificamente da Etiópia, da região de Kaffa. Os grãos consistem no
fruto do cafeeiro, que pertence à família das rubiáceas e tem formato
pequeno, arredondado e de cor vermelha. Existem registros de sua
utilização desde a Pérsia do século VIII e sua migração para a Arábia,
de onde ganhou o mundo depois de ter se aclimatado muito bem, data do
século XV.
Antes de chegar ao Velho Continente, o caffé (em italiano) primeiro se
tornou conhecido dos africanos e dos árabes.
Na
Etiópia, sua terra natal, era consumido como manteiga sob a forma de
pasta. Tornou-se bebida na Arábia do Sul já que ajudava alguns povos
locais a se manterem acordados para suas preces noturnas. No final da
Idade Média, o café passou a ser oferecido em estabelecimentos do Cairo e
de Meca, apesar das resistências dos grupos fundamentalistas islâmicos,
que por suas qualidades estimulantes condenavam seu consumo.
Comercializado
pelos turcos com as cidades italianas, entre as quais especial destaque
para Veneza, o Kaffee (em alemão) foi ganhando terreno em outros países
da Europa a partir de estabelecimentos em que as pessoas se sentiam
confortáveis para reunir-se e conversar. Esses pontos de encontro tinham
ambientes sofisticados e agradaram muito as camadas dominantes e
ascendentes, como a nobreza e os burgueses.
O
crescente consumo de café em terras européias durante os séculos XVII e
principalmente XVIII motivou a ampliação das áreas de plantio, já que os
árabes não conseguiam abastecer de forma satisfatória a crescente
demanda. Isso fez com que os holandeses conseguissem alguns pés de café e
os levassem para suas colônias orientais em Java e no Sri Lanka.
Depois de
algum tempo essas plantas foram também transplantadas para terras
americanas controladas pelos batavos, como a Martinica, São Domingos e o
Suriname. A França e a Inglaterra se mostraram igualmente dispostas a
trabalhar com o café em virtude de suas grandes possibilidades
comerciais e implementaram plantações na Guiana Francesa e na Jamaica.
Foi, porém
no Brasil, para onde o produto foi inicialmente trazido por Francisco
de Mello Palheta, vindo da Guiné Francesa para o Pará, que o produto
viria a se tornar universalmente popular e de grande consumo algum tempo
depois.
A história do café no Brasil, a partir do século XVIII, é tão marcante
para os rumos do país a partir de então que, de acordo com os
economistas e historiadores, não seria possível conceber os avanços
pelos quais passou essa nação sem os ricos rendimentos obtidos pelos
barões do café.
Foram os
lucros provenientes dessa lavoura, intensificada a partir das décadas de
1830 e 1840 no estado de São Paulo, que permitiram o surgimento das
estradas de ferro, o avanço da urbanização, a entrada de grandes levas
de imigrantes europeus (italianos, alemães, espanhóis,...) o
deslocamento do centro de poder político do Nordeste para o Sudeste e,
até mesmo o refinamento dos modos e costumes brasileiros.
A
introdução do café, inicialmente no norte do Brasil, não deu os
resultados esperados. Isso acarretou uma espera ligeiramente prolongada,
de aproximadamente 90 anos, até que o produto viesse a ser produzido em
escala crescente nas regiões aonde iria realmente reinar, ou seja,
principalmente em São Paulo. Antes de entrar em terras paulistas foi
feita uma incursão no Rio de Janeiro, onde a adaptação do Coffee (em
inglês) não foi bem sucedida.
A
influência do café no Brasil também pode ser medida pela relação traçada
por vários historiadores e pesquisadores sobre sua influência nos rumos
da abolição da escravatura ocorrida em 1888. A necessidade de mão de
obra mais qualificada e estimulada para o trabalho teria motivado os
barões do café de São Paulo a substituir progressivamente seus escravos
pelos imigrantes europeus.
Isso pode
ser percebido até mesmo a partir dos dados relativos aos primeiros
centros produtores de café, como o Vale do Paraíba fluminense,
comparativamente as novas regiões de produção cafeeira, como o Oeste de
São Paulo.
Convém lembrar que, a partir do século XIX, os registros de consumo do
café em termos mundiais destacam crescimentos vertiginosos.
Para
exemplificar podemos ver o caso da França que entre 1815 e 1938 teve o
consumo do vinho dos árabes (como também ficou conhecido o café)
multiplicado 24 vezes. Dados mais contemporâneos, como aqueles da
Alemanha dos anos 1970, demonstram uma afeição cada vez maior pela
bebida ao atestarem um crescimento de 352 litros no início da década
para 455 litros por pessoa ao final daquele período.
O
surgimento dos cafés como centros de consumo especializado nessa bebida
na Europa também foram decisivos para a explosão de consumo do produto
mundo afora. O requinte relacionado a esses estabelecimentos, o
crescente fluxo mundial de viajantes (a turismo ou negócios) e também a
variedade de novos produtos relacionados ao café agregados a esses
mercadores sofisticados da bebida certamente auxiliaram no seu
crescimento de vendas.
Nos dias
de hoje calcula-se que de todo o café consumido mundialmente
aproximadamente 95% sejam de duas espécies, o Coffea arábica e o Coffea
robusta. Esse café é proveniente de plantações que existem em países
como a Colômbia, a Costa Rica, a Arábia Saudita, a Índia, a Etiópia,
Angola, Zaire, México e principalmente do Brasil, o maior produtor
mundial.
O que se
sabe, ao certo, é que hoje em dia é muito difícil ficar longe de um bom
cafezinho a nos despertar os sentidos, inebriar a alma e acelerar os
passos. Isso nos faz recordar um pronunciamento a respeito do café de um
dos maiores personagens da história, o general e imperador da França no
início do século XIX, Napoleão Bonaparte: “O café, forte e abundante,
desperta-me. Dá-me calor, uma força invulgar, uma dor não sem prazer.
Prefiro sofrer do que ser insensível”.
Prof. Dr. João Luís de Almeida Machado
é membro da Academia Caçapavense de Letras
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