Ele acompanhou de perto a saga dos irmãos Villas-Bôas durante a
expedição Roncador-Xingu, que culminou com a criação do Parque Nacional
do Xingu em 1961, em Mato Grosso. O piloto mato-grossense Lisardo
Fernandes deu assistência direta aos índios e aos expedicionários que
realizavam a “marcha para o oeste”, promovida pelo governo de Getúlio
Vargas, no início dos anos 40. À reportagem, Fernandes relembrou a
aventura dos três irmãos rumo ao interior do Brasil. A expedição voltou à
tona com o recém-lançado filme Xingu, do diretor Cao Hamburguer.
A expedição tinha por objetivo promover a interiorização do Brasil, a
partir do desbravamento de terras ainda desconhecidas na época. A
demarcação das terras teve início com a abertura de estradas e com a
construção de campos de pouso de emergência para as aeronaves, que eram
indispensáveis à manutenção da expedição.
Tudo o que parecia ser um conflito violento entre os índios que
habitavam a região se tornou um contato amistoso, que levou ao
conhecimento das etnias e de suas necessidades, como a proteção às
terras, à saúde e à cultura dos índios.
A região às margens do rio Xingu abriga atualmente cerca de 16 etnias,
no entorno do municípios de Nova Xavantina, cidade localizada a 651 km
de Cuiabá. Contratado pela Funai de Mato Grosso, somente Lisardo era
autorizado a sobrevoar as regiões de reserva indígena, protegidas pelo
governo federal.
Durante a década de 70, com apenas 25 anos de idade, Lisardo fazia voos
diários para a região norte de Mato Grosso, com o objetivo de
transportar alimentos e medicamentos às aldeias, mas sua atuação teve um
papel fundamental da manutenção da expedição e na sobrevivência dos
xinguanos durante o período de epidemia de sarampo que acometeu grande
parte da população indígena naquela época.
“O avião era gênero de primeira necessidade e era o único contato com a
civilização. Aquele tempo a aviação tinha seus riscos, porque não
tínhamos o GPS e a navegação era feita via cronômetro", disse.
O piloto aposentado contou ainda os desafios vividos pelos
expedicionários, que mantinham contato por meio de um clareira, para que
os alimentos fossem atirados do avião.
Durante o período da expedição, Lisardo conheceu os irmãos Leonardo,
Orlando e Claúdio Villas-Bôas, quando eles tentavam contato com os
índios da etnia panará. "Eles traziam consigo vários índios xinguanos
que auxiliavam na comunicação" revelou.
Da convivência com os irmãos Villas-Bôas ele pôde confirmar vários
episódios que foram retratados no filme Xingu e resaltou a dedicação dos
irmãos, que tinham como lema a “proteção total aos índios”.
Registro histórico
Um imagem feita pelo fotógrafo Pedro Martinelli mostra o avião de
Lisardo rodeado pelos índios. O registro fotográfico ocorreu logo após
um pouso na reserva indígena em que os índios, curiosos com o meio de
transporte, acreditavam que a aeronave se tratava de uma estrela
cadente. Diante da curiosidade, Lisardo realizou um sobrevoo com os
indígenas sobre as aldeias, o que causou espanto e deslumbramento entre
os nativos.
Índios panarás assustados com aeronave de Lisandro - Foto: Arquivo pessoal
"Eles começaram a subir no teto e na asa do avião. Nesse dia fui fazer o
sobrevoo para mostrar onde era a aldeia deles. Eles ficaram assustados e
não entendiam como levavam um dia inteiro para chegar nas aldeias",
recordou.
Em Cuiabá, a esposa de Lisardo, Verenice Fernandes e duas filhas ficavam
à espera do marido durante as viagens até o norte de Mato Grosso. “Ele
saia para fazer o voo e na volta se chovia, tinha que permanecer no
local até que o tempo melhorasse. A gente tinha muita fé de que nada ia
acontecer, que tudo daria certo e que ele ia voltar com vida”,
relembrou.
Para Lisardo só restaram vastas lembranças, que hoje podem ser
recordadas. Anos depois, o piloto aposentado se diz orgulhoso por ter
contribuído com um projeto que se tornou o marco de proteção aos
direitos indígenas. “Para mim era uma satisfação poder contar a história
e pensar : Eu vi aquela história, eu estava lá”, afirmou.
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