Foi mais uma
daquelas noites de muita chuva e ventos fortes na região sudeste do país. O
choque de uma frente fria com uma massa de ar quente causou bastante
dificuldade para os aviões que chegavam em São Paulo naquele final de abril.
Meu voo, de
Brasília para Viracopos/Campinas, decolou às sete e quinze da noite conforme o
previsto e ao atingir o nível de cruzeiro visualizamos diversas nuvens pesadas
à frente.
Um desvio para lá, outro para
cá e deixamos Uberaba para trás. Entrando no estado de São Paulo, ainda
desviando das nuvens pesadas, iniciamos a descida cientes das condições
meteorológicas de Congonhas, Guarulhos e Viracopos.
Guarulhos, que estivera
fechado para pousos e decolagens por aproximadamente 25 minutos, estava aberto
e o controle de tráfego aéreo retomava o sequenciamento das aeronaves que até
então estavam em espera. Neste momento Congonhas teve suas operações suspensas
por estar debaixo de chuva forte e os aviões que para lá se destinavam
iniciavam espera. Viracopos estava aberto, porém com chuva leve sobre a pista.
Nestas horas
o controlador de tráfego aéreo tem que ser bom! Os pilotos que estão em voos de
espera ficam pressionando por estimativas de melhora e abertura dos aeroportos;
até parece que não sabem que o controlador, que está dentro de uma sala
fechada, não tem como prever quanto tempo vai levar para a chuva passar.
Quem
determina se o campo está aberto para pousos é a torre de controle, que no caso
de Congonhas, ainda depende da administradora do aeroporto para fazer uma
vistoria na pista antes de liberá-la. Os pilotos, de olho na quantidade de
combustível a bordo, analisam suas alternativas primárias e secundárias já que
nem sempre podem seguir para determinado aeroporto devido à lotação de pátios
para estacionamento e outras dificuldades inerentes à infraestrutura
aeroportuária brasileira.
Próximos a Viracopos, vendo nitidamente pela
tela do radar meteorológico que a cidade de campinas estava debaixo de um CB
(nuvens de chuva forte), fomos orientados a voar em círculos, pois nosso
destino estava fechado para pousos. Com bastante combustível de reserva e para
não congestionar a frequência rádio desnecdesnecessariamente,
iniciamos nossa espera informando aos passageiros a nossa situação. O vento era
forte e aparentemente estava empurrando para longe do aeroporto as nuvens
pesadas. Nosso aeroporto de alternativa era Confins/Belo Horizonte cujo tempo
permanecia bom, a frente fria ainda não havia chegado por lá. Além de Confins
ainda poderíamos contar com Guarulhos e Galeão, o que nos deixava bastante
tranquilos.
Não foi
necessário nem quinze minutos de espera e Viracopos abriu, a chuva ainda estava
sobre o campo, mas agora com fraca intensidade. Orientados pelo controle de
tráfego aéreo, entramos na sequência para pouso recebendo uma informação que
para mim foi inédita: havia bastante quantidade de granizo sobre a pista de
pouso!
À nossa frente seguiam duas outras aeronaves,
o que era bom, pois assim os pilotos ao pousarem poderiam passar alguma
informação relevante caso encontrassem alguma dificuldade no pouso, além do
mais, dois aviões pousando antes de nós, certamente dissipariam parte do
granizo.
Na
aproximação final, com chuva nos para-brisas, não demorou para avistarmos a
pista, o vento já não era forte e estava praticamente alinhado com a nossa
trajetória. Na área de toque dos pneus com a pista quase não havia mais
granizo, porém, à medida que a velocidade diminuía, não apenas víamos uma
grande quantidade deles sobre a pista, mas também sentíamos o avião rolando
sobre pedras de gelo.
Em 30 anos
de aviação, esta foi uma situação inédita para mim. Já pousei debaixo de chuva
forte, debaixo de neve, ventos laterais, de cauda, com raios e rajadas, mas em
uma pista parcialmente coberta de granizos (ice-pellets, ou ainda, hail, em inglês), foi a
primeira vez!
Comandante Beto Carvalho
é aviador e piloto dos grandes jatos
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