Para manter seus voos no horário, as empresas aéreas enfrentam uma série de variáveis no seu dia a dia, sendo as mais comuns, os problemas meteorológicos e de manutenção das aeronaves.
Há problemas relacionados ao gerenciamento do tráfego aéreo, infraestrutura dos aeroportos e uma série de outros fatores que exige um planejamento rápido e hábil, pois a malha de voos é um grande quebra cabeças e um avião parado ou atrasado pode afetar os demais voos.
Outro aspecto que de tempos em tempos dá um nó na malha aérea de uma empresa são as catástrofes naturais, tais como enchentes, nevascas, terremotos, cinzas vulcânicas e tsunamis. Por fim, de tempos em tempos surgem guerras civis e conflitos entre países que fazem com que as empresas tenham que alterar completamente seu planejamento.
A “velha” Varig, em seus 79 anos de existência, acompanhou vários destes episódios, disponibilizando seus porões de carga para o transporte de mantimentos e ajuda às vítimas de catástrofes naturais, bem como deslocou aeronaves para trazer de volta brasileiros que estavam no exterior.
Vejamos alguns episódios:
Em setembro de 1985 um terremoto de 8.1 graus na escala Richter atingiu a Cidade do México. A terra tremeu por pouco mais de dois minutos, suficiente para causar mortes e destruição, tendo sido uma das maiores catástrofes naturais do México.
Havia uma tripulação da Varig pernoitando na Cidade do México, onde, além do susto, nada aconteceu, pois o hotel era resistente a abalos sísmicos. Naquela noite, apesar do caos na cidade, a tripulação embarcou para um voo lotado de volta ao Brasil. Nos dias seguintes a Varig remanejou sua malha para, com o maior avião da frota - na época o DC-10 - efetuar voos extras para o México. O avião ia vazio e regressava lotado de brasileiros ávidos para regressar ao Brasil.
Nestas localidades sujeitas a terremotos, pequenos tremores acontecem todos os dias, e os tripulantes já estão acostumados a observar a água tremer na garrafa ou o lustre dar uma pequena balançada. Periodicamente os hotéis efetuam treinamento simulado para evacuação em caso de tremores.
Dez anos depois, em janeiro de 1995, o Japão sentiu a força da natureza, um terremoto de 7.2 graus na escala Richter destruiu a cidade de Kobe. Mais uma vez a Varig se viu na obrigação de ajudar e deslocou Jumbos 747, que normalmente fariam a rota para Paris, para atender a demanda e brasileiros que lá estavam. O avião ia vazio e voltava lotado.
Em dezembro de 1999 a região de Caracas e Maiquetía (cidade no litoral da Venezuela onde está o aeroporto internacional que atende à cidade de Caracas) foi acometida pelas piores chuvas em cem anos. Agravado pelo desmatamento irregular e pela ocupação desordenada das encostas, a terra encharcada e saturada desceu as montanhas.
Houve deslizamentos ao longo de 80 quilômetros do litoral, sendo que na região de Maiquetía, nada menos que vinte quilômetros de terra deslizou montanha a baixo atingindo a população e causando destruição generalizada. Os números oficiais apontaram para dez mil mortos, mas extra oficialmente este número pode ter sido até cinco vezes maior!
Hospedada no Hotel Sheraton Maiquetía, estava a tripulação do comandante Traverso, que havia chegado dias antes num Boeing 767 e já observava os estragos que as chuvas vinham causando. Como o hotel estava localizado no alto de uma pequena colina, ele não foi atingido pela terra que desceu carregando pedras e tudo mais que encontrou pela frente. Os tripulantes, assim como os demais hospedes, ficaram dias presos nas dependências do hotel com dificuldade de comunicação, racionamento comida, água e luz, pois os acessos estavam todos bloqueados e o caos era total.
O dia estava raiando quando o comandante Traverso acordou com um barulho de helicóptero que parecia voar bem próximo à sua janela. Curioso, foi ver o que estava acontecendo e viu que uma operação de resgate estava sendo realizada, afinal, o hotel estava completamente cercado de terra, lama e água.
Porém naquele momento o helicóptero dos Fuzileiros da Marinha Americana, que pousava no jardim do hotel, estava resgatando apenas aqueles que já estavam previamente autorizados.
O Embaixador Brasileiro na Venezuela teve que intervir para agilizar o resgate dos tripulantes, que com o mínimo de pertences possível, embarcaram no helicóptero militar, que fazia uma verdadeira “ponte aérea” do hotel para o aeroporto de Maiquetía, que tinha se transformado numa base de operações para ajuda e resgate das vítimas.
De lá eles, conseguiram um contato com o gerente local da Varig, que disponibilizou um transporte para subir a serra em direção a Caracas, que não fora afetada pelos deslizamentos de terra. Mas a viagem foi uma verdadeira epopeia, pois depois de enfrentar uma fila de duas horas para encher o tanque da condução, ainda enfrentaram mais quatro horas para chegar a um hotel em Caracas.
No dia seguinte a Varig deslocou um avião para resgatar a tripulação e os passageiros que precisavam regressar ao Brasil, mas como Maiquetía ainda estava interditada para as operações das empresas aéreas, o 767 pousou em Valência, uma cidade a 170 quilômetros de Caracas. Os tripulantes, ainda com a mesma roupa que estavam no momento da evacuação, voltaram de passageiros, até porque, estavam exaustos e sem qualquer condição de trabalhar. À medida que a situação na região foi melhorando, a Varig continuou efetuando voos extras para resgatar os brasileiros.
Continua na semana que vem, aguardem...
Comandante Beto Carvalho
é aviador e piloto dos grandes jatos
Nenhum comentário:
Postar um comentário