Estou contando esta história porque, ele vendo eu contar as de outros, me pediu:
“ - Conte a minha Pai!” Então aí vai!
Conheci este “caboclinho”, quando ele tinha mais ou menos uns quatro meses de idade. Era bem magrinho, estava passando por uma fase bem difícil, com uma infecção intestinal que o levou a maus momentos.
Nesta época, estava começando meu namoro com sua mãe, e via necessidade de ajudá-la. Várias vezes, estive com ele no hospital, nas farmácias e com muito sacrifício de minha parte, de sua avó e de sua mãe, acabamos por vê-lo melhorando, ganhando uns quilinhos sem, no entanto ficar gordo.
Nesta época eu vi quando era importante aquele programa social “Leite para as crianças” implantado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso!
Vi muitas vezes sua avó batalhar por um ticket do leite, e o quanto ficava alegre ao conseguir dois deles. Notava que ela tinha cuidados e carinhos muito especiais para com ele. Que Deus a tenha!
Paulo Henrique, querendo embarcar no PT-CZC
Quando sua mãe veio morar comigo, ele já tinha um ano de idade, e esta historia ocorreu quando tinha uns três anos e era terrível, não parava nunca, que energia, meu Deus! Os remédios que ele tomou tiveram-lhe muita valia!
Numa determinada época, recebemos a visita de meu compadre Felipão, e recordamos uma passagem interessante dele.
Geralmente era eu que fazia a pesagem da mercadoria que ia ser carregada no avião, imagine vocês se iria confiar esta tarefa a qualquer um! Ali estava a minha segurança, a minha vida! Quinhentos quilos é coisa para doido! Ainda estou procurando o primeiro piloto que começou com esta loucura, se pegar, mato!
Porém, meu amigo Felipe era um dos únicos em que confiava para esta tarefa, afinal ele ia comigo, e o risco também era dele!
Numa manhã, estávamos preparando um vôo e como sempre o Paulinho não deixava ninguém em paz, mexia em tudo! Dado momento, arrancou os óculos de meu compadre e isto o deixou tão irritado, que ele pegou-o pelos braços e, levando-o até a cozinha, deu uma bronca na Lucivania:
“ - Segura este monstrinho aí!” E voltou a fazer a pesagem de sua mercadoria, ainda muito aborrecido.
Terminamos de colocar a carga no avião e como sempre o Felipe me ajudando.
“ - Vamos embora Felipe!
- Arrocha compadre, que está tudo no jeito!”
Como era e ainda é, um apaixonado pela aviação, sempre o deixava segurar o manche, ensinando coisa aqui e acolá, tanta coisa, que por fim o danado já estava começando a pousar, decolar! Pegou o jeito rapidinho!
“ – Acompanhe-me na decolagem! Disse-lhe.
- Ok!
- Está na hora! Puxe, puxe! Agora abaixe o nariz! Ótimo, está com você. Arrocha!
E assim íamos nós, naquela farra! Hoje, escrevendo esta história, sinto saudade daqueles bons tempos, a gente era feliz e não sabia!
Porém, naquele momento, notava que tinha alguma coisa errada, o avião estava demorando demais para ganhar altura, a garganta da serra da Mutuca (onde hoje é a Vale), por onde iríamos passar, estava se aproximando, e nós ainda estávamos voando muito baixo!
Pensei: o peso não é pois foi o Felipe que pesou, confio nele, será que este motor já esta abrindo o bico? Aí o vôo começou a ficar tenso.
Quando chegamos na Fazenda Paraná, aonde teríamos que pousar, ele falou:
“ - Vamos marcar um ponto no seu GPS, aonde vou fazer uma pista!
- Ok Felipe!”
Abaixei mais o avião e me preparei para passar bem em cima do ponto da onde ele queria fazer a pista. Quando cruzei, ele me pediu:
“ - Vire à esquerda!”
Moço, quando virei, o avião deu uma afundada tão violenta, que levei um susto, tratei de nivelá-lo e, virando para meu amigo, disse:
“ - Tem alguma coisa errada, Felipe! Este avião está muito pesado! Vamos voltar e pousar!
Aquilo deixou meu compadre preocupado, afinal foi ele que pesou a mercadoria e viu o sufoco que passei para não deixar o avião stolar.
Já no pouso, senti que o problema era excesso de peso, porem não falei nada com Felipe! Voltei para Tucumã pensando naquilo! Caramba, escapei mais uma vez!
Na outra semana, fui fazer novo vôo, e quando lá cheguei, Felipe veio ao meu encontro:
“ - Niltinho, quando você me deixou aqui na semana passada, pesei a carga, e de fato, ela estava com excesso de 40 quilos! Desculpe-me, foi à hora em que estava pesando, o Paulo Henrique estava me perturbando demais, me distraí, coloquei a carcaça da bomba e não somei, e foi aí o erro, na verdade estávamos com 540 quilos! Desculpe-me meu compadre!
Daí em diante comecei a ficar de olho nele!
Desta vez foi eu que ia levando a pior, porém, em outra história, foi ele, Paulo Henrique! Não é que quase o matei !
Tinha acabado de pousar, meu “secretário” veio abrir a porta do hangar e como sempre trouxe o Paulinho! Parecia que ele conhecia o barulho do avião. Vinha correndo, aquilo para ele era a maior felicidade, ficava doido para me dar um abraço!
E como sempre, eu entrava no hangar com o motor ligado, para não ser necessário empurrar a aeronave!
Já estava quase dentro do hangar, quando vi Paulinho vir correndo pelo lado direito do avião, me acenando, todo sorridente e, como ele gostava de passar por debaixo do avião, bem perto da hélice, pensei, ele vai entrar!
Naquele meu desespero, vendo o garoto ser morto pela hélice, acenava, tentando atrair sua atenção, tentando mantê-lo à minha frente, com a mão direita acenando e com a esquerda na mistura desligando o motor o mais rápido possível!
Tinha certeza que ele iria entrar por debaixo, e de fato entrou! Quando o vi desaparecer de vista, gelei, gritando:
“ - Matei o garoto, matei o garoto! Meu Deus o que fui fazer?”
Foi aí que senti a dor de perder um filho, é realmente muito triste! Tinha certeza que a hélice o pegara! Porém o Senhor deve ter dito: Ainda não será desta vez Paulinho, você ainda vai passar muito sufoco com seu pai (estes, em outras histórias!)!
Graças a Deus ele foi salvo e, quando olhei para a esquerda, lá estava ele, me acenando. Todo alegre, rezei: “ - Obrigado meu Deus!”
Daquele dia em diante, sempre desligava o motor e depois empurrava o avião para dentro do hangar!
Comandante Niltinho
é piloto de garimpo
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