A conversão de Orlando Silva em ex-ministro arrastou para o epicentro do escândalo do Esporte o governador de Brasília Agnelo Queiroz (PT). Deve-se a Agnelo, antecessor de Orlando na pasta do Esporte, o ingresso do policial militar João Dias no rentável universo dos convênios governamentais.
Grampos telefônicos obtidos pelos repórteres Andrei Meireles, Marcelo Rocha e Murilo Ramos revelam que o PM e o governador são mais íntimos do que admitem. Feitas com autorização judicial, as escutas recheiam uma ação penal que corre na 10a Vara Federal de Brasília. Nos próximos dias, os autos serão remetidos ao STJ.
A tróica de repórteres manuseou parte do papelório que compõe os nove volumes e quatro apensos do processo. Entre os documentos, estão transcrições dos grampos. O conteúdo foi esmiuçado em notícia veiculada por ‘Época’.
Num dos relatórios, de número 45/2010, constam diálogos travados entre 25 de fevereiro e 11 de março do ano passado. Conversas vadias. Nessa ocasião, Agnelo já havia deixado o Ministério do Esporte. Era diretor Anvisa. Migrara do PCdoB para o PT e disputava a vaga de candidato a governador.
Beneficiado com repasses de R$ 2,9 milhões do programa Segundo tempo, João Dias tornara-se candidato a deputado distrital pelo PCdoB. Virara também alvo de um inquérito da Polícia Civil, supervisionado pelo Ministério Público.
Os grampos demonstram que o PM prepava sua defesa. Tentava obter documentos para encobrir fraudes que suas duas ONGs praticaram nos convênios com o Esporte. João Dias recorreu a Agnelo, eis a evidência que salta das escutas telefônicas. São quatro os principais interlocutors das conversas.
Além de João Dias e Agnelo, soam nos gampos as vozes de Michael de Farias, advogado do PM, e do professor Roldão Sales de Lima. Roldão era diretor de ensino de Sobradinho, cidadade-satélite de Brasília onde atuavam as ONGs de João Dias.
O policial militar precisava que o professor Roldão assinasse um documento atestando que suas entidades proveram atividades esportivas a crianças carentes. Contratado pela pasta do Esporte para atender a 10 mil crianças, João Dias beneficiara apenas 160. Ainda assim, informa o processo judicial, de forma precária.
Pelo telefone, João Dias pediu a Agnelo que pressionasse o professor Roldão a rubricar o documente que fundamentaria sua defesa. O PM encontrou-se com Roldão num restaurante. Tocou o telefone para Agnelo. Passou o aparelho para o professor.
Lero vai, lero vem Agnelo disse a Roldão que precisava de sua ajuda. Afirmou que combinaria com João Dias um encontro a três. Referiu-se ao interlocutor como “peça-chave neste projeto”. Que projeto?
Segundo o Ministério Público, tratava-se da empreitada que livraria João Dias do ressarcimento das verbas desviadas –R$ 3,2 milhões, em valores de hoje. Noutro telefonema, o advogado Michael de Farias informou ao seu cliente que estava preparando o documente que Roldão assinaria.
Guiando-se pelos grampos, a polícia monitorou o encontro de João Dias e Roldão. Deu-se em 12 de março de 2010, numa via pública de Brasília: o Eixo Rodoviário Norte. O PM parou o seu Ford Fusion. Acionou o pisca-alerta. Roldão estacionou seu Fiat Strada atrás. Entrou no carro de João Dias. Tudo fotografado pela polícia.
Pelas imagens, percebe-se que Roldão carregava uma pasta laranja. Saiu do automóvel do PM sem ela. Três horas depois, a defesa de João Dias foi protocolada na Justiça Federal. O esforço resultou infrutífero. Laudo da Polícia Federal constataria que a peça continha documentos “inidôneos”. Ouvido, Agnelo chamou o processo de “armação.”
Noves fora o lote de grampos, Agnelo é emparedado por um vídeo gravado pelo motorista Geraldo Nascimento de Andrade. Vem a ser a principal testemunha de acusação do governador. Em reiterados depoimentos, Geraldo disse que entregou pessoalmente a Agnelo propina de R$ 256 mil. Dinheiro desviado do Esporte.
A equipe de Época diz ter assistido ao vídeo. O repórter Cláudio Dantas Sequeira, de ‘IstoÉ’, informa que obteve cópia integral. Vai abaixo uma versão editada que a revista veicula na edição deste fim de semana.
O motorista Geraldo, 25 anos, personagem de aparência humilde, alega que, depois de denunciar Agnelo, passou a ser ameaçado por João Dias. Por isso teria gravado o video. Na peça, descreve detalhes do esquema urdido para malversar verbas do Esporte. Reconhece que ele próprio servia à quadrilha como laranja. Virou sócio da JG, uma empresa de fachada.
A gravação traz uma revelação inquietante. Geraldo declara que notas frias foram usadas também para desviar dinheiro do programa Primeiro Emprego, do Ministério do Trabalho. Menciona convênio que destinou R$ 8,2 milhões à Fundação Oscar Rudge, do Rio de Janeiro.
Presidente da entidade, Clemilce Carvalho admite que a JG, empresa da qual Geraldo diz ser sócio-laranja, foi contratada como por meio de pregão e prestou serviços. Clemilce é fliliada ao PDT, partido do ministro Carlos Lupi.
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