Uma taça de vinho por dia já seria o
suficiente para prevenir contra várias doenças, inclusive ajudar a prevenir o
câncer de pulmão.
A hipótese, já testada por diversos grupos de estudos há 20
anos, deu mais um passo em um laboratório do Instituto de Bioquímica Médica da
UFRJ. Em artigo publicado esta semana na “PLOS One”, uma das mais prestigiosas
publicações científicas do mundo, a equipe de Jerson Lima Silva descobriu que o
resveratrol, um composto presente na casca da uva, quando associado a uma
proteína que suprime o desenvolvimento de tumores, pode levar à morte de células
cancerígenas.
A p53, a proteína em questão, é uma
das principais guardiãs do DNA. Ela é ativada pela célula sempre que há algum
tipo de desordem no metabolismo ou dano genético causado por fatores externos,
como a exposição à radiação. São episódios constantes no dia a dia, exigindo
que ela proteja o genoma. Quando ocorre um dano ao DNA, a proteína passa por
mutações; estas, por sua vez, podem levar ao câncer. Por vezes, há mecanismos
dentro da própria célula que podem reparar o estrago. Em outros casos, porém, a
célula morre.
A pesquisa da UFRJ mostrou que, em
células incapazes de produzir esta proteína, ela pode ser introduzida junto ao
resveratrol. Ao mesmo tempo que mata as células cancerígenas, as células
saudáveis são preservadas.
O estudo, por enquanto, está
concentrado em linhagens de tumor de mama e de câncer de pulmão. Segundo os
pesquisadores, é cedo para pensar em testes clínicos ou na criação de um
tratamento a partir de suas conclusões.
O raciocínio foi: se a maioria dos
tumores ocorre devido à falta ou mal funcionamento da p53, por que não
colocá-la em sua forma normal na célula para que ela volte a protegê-la? Vimos
então que, associada ao resveratrol, a proteína induzia à morte daquelas
células cancerígenas.
A p53, embora popular nas estratégias
anticâncer, ainda propõe um desafio aos cientistas. Seu tempo de permanência
ativa, em que ela exerce funções para suprimir o tumor, é muito curto,
restringindo-se a alguns minutos. Depois, ela se deteriora. Terapias gênicas e
formas para inibir a degradação da proteína têm sido propostas por diversos
grupos de estudos.
O resveratrol, por sua vez, demorou
meio século para cair nas graças do meio científico. Descoberto em 1940, ele só
ganhou os holofotes em 1992, quando foi identificado no vinho tinto. Cinco anos
depois, demonstrou-se pela primeira vez que ele era capaz de prevenir o câncer.
O composto é um obstáculo ao desenvolvimento de tumores, atuando tanto em sua
iniciação, quando nos estágios seguintes — a promoção e a progressão.
Mas, assim como a p53, o resveratrol
ainda guarda respostas fundamentais para as terapias contra o câncer. Até o ano passado, havia apenas dez
ensaios clínicos com este composto — ressalta Danielly Ferraz da Costa, autora
principal do estudo.
A principal fonte é o vinho tinto, mas há poucos
trabalhos sobre sua disponibilidade, e não sabemos o quanto do resveratrol
atingiria o alvo, ou seja, as células cancerígenas.
A quantidade do composto expelida pelos
rins é um mistério, mas não deve ser compensada pelo consumo abusivo de vinho.
Beber demais, afinal, traz o efeito maléfico do álcool.
Uma taça por dia já está bom,
calcula Danielly. "Não sabemos o quanto de resveratrol chegará às células
cancerígenas, mas pelo menos dessa forma fazemos uma ingestão frequente."
Para quem não é fã de vinho, o mesmo
composto pode ser encontrado no suco de uva e em mais de 70 frutas e
hortaliças. Vale lembrar que a Organização Mundial de Saúde recomenda o consumo
de 400 gramas desses alimentos por dia, e que 30% dos casos de câncer têm
origem em uma dieta inadequada, um percentual maior do que o atribuído a
fatores genéticos (20%).
Um estímulo extra é que o resveratrol,
além de seu papel anticancerígeno, é também um antibiótico natural,
anti-inflamatório, atua contra a diabetes e ataca a obesidade.
De acordo com Danielly, a próxima etapa
é testar a toxicidade do composto nas células saudáveis, embora a meta é que
elas não sejam atingidas. "Queremos encontrar um composto
específico para as células tumorais, na maioria das
vezes isso não acontece. Por isso, a quimioterapia costuma ser tão agressiva e
provoca efeitos colaterais, como a queda de cabelo." revela a pesquisadora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário