Esta historia aconteceu quando o IBAMA, juntamente com a Policia Federal, resolveram dar um basta para valer na extração ilegal de mogno, e aí meus amigos foi a maior bagaceira que já vi em toda a minha vida! Não sobrou pedra sob pedra "ou melhor” dizendo madeireiro sob madeireiro!
Esta raça de gente começou a ser caçada igual bicho pelo IBAMA! O que eles encontravam, desde caminhão, pá carregadeira, skid, trator, trator de esteira, avião, esposa de madeireiro, amante, cozinheira, piloto, tudo foi pro pau mesmo, acredito que nem os próprios agentes esperavam uma operação daquela ordem!
Tudo começou quando meu amigo Scalabrim chegou na beira do rio Curuá e simplesmente trancou o rio, para passar com sua comitiva para o outro lado, no rumo de um canteiro de mogno que havíamos localizado,não mais abrindo a passagem, deixando os ribeirinhos sem opções para subir o rio até a cabeceira, fechando assim à única estrada da área!
E não foi falta de avisar pois, uns dias antes, eu havia pousado na pista do Pontal do Rio Iriri com o Rio Curuá, e encontrei o dono de um barco, daqueles tão comuns nos rios da Amazônia, que faz entrega de mercadoria, carrega gente, porco, galinha, castanha, enfim, são a única ligação entre o povo que vive na floresta com a cidade, no caso, Altamira!
Ele estava muito bravo, em razão de não poder atingir o alto do Rio Curuá, em decorrência do ato do madeireiro, tendo que voltar para Altamira e imaginem, conforme disse em cinqüenta anos navegando por aquele rio, seria a primeira vez que seria obrigado a retornar, impedido que estava de prosseguir!
Ele não se conformava, dizendo que iria reclamar à Capitania dos Portos, e até mesmo falaria com a justiça, em Belém, caso o assunto não fosse resolvido!
Ele falou com tanta raiva, que acabou por assustar-me e, coberto de razão, acabou cumprindo o prometido!
Mesmo assim tratei de tranquilizá-lo, dizendo que iria falar com o Scalabrim.
De volta a São Felix do Xingu, contatei o Nelson, que era o grande assessor do Scalabrim, contando-lhe o que havia presenciado, sendo que até hoje não sei se ele alertou o Scalabrim ou não! Mas, como a situação permanecia, acredito que não.
E aí meus amigos, o tempo fechou, e tem gente ate hoje chorando as mágoas, para não falar dos prejuízos!
Estávamos justamente no meio da safra quando a operação do IBAMA e da Polícia Federal começou, e, graça a Deus escapei por muito pouco, porém aquilo que vi, jamais vou esquecer!
O movimento que girava em torno do mogno era tão grande, mas tão grande mesmo, que, imaginem vocês, qualquer madeireiro fazia um movimento de um milhão de dólares brincando, e todo mundo da cidade tirava uma casquinha!
Começava assim: na floresta ele valia cinquenta reais o metro cúbico; na serraria, duzentos; em Belém, já valia quinhentos; na exportação, já era em torno de mil; nos EUA, já ia para mil e quinhentos, e assim por diante.
Esse esquema da retirada do mogno era montado bem antes da safra e imaginem vocês que, de uma hora para outra a coisa começou a desmoronar, só via madeireiro se escondendo, os mais espertos, vazavam para bem longe, os mais bestas, a Polícia Federal prendia!
E assim foi! Após a Federal ter baixado na pista do Pontal e ter apreendido todas as maquinas (a maioria alugadas) e caminhões, do Scalabrim e determinado a abertura do rio o clima ficou feio para meu lado, pois todos meus voos estavam anotados em um simples caderno, não tinha nenhum contrato de trabalho ou de prestação de serviços, o escritório de São Felix do Xingú fechado, o Scalabrim desaparecido! Acabou ficando só eu e o Nelson que, um dia me disse:
- Abasteça o avião bem cedo, que vamos resgatar um pessoal que conseguiu fugir da Polícia Federal, sendo que dois estão vindo pela mata, na altura da Mineração Canopus, onde também existem operações da Polícia Federal, alguns estão na beira do Rio Iriri e outros estão presos no Pontal junto com as maquinas!
“- Prepare-se Niltinho que hoje nós vamos peitar a Federal e vamos começar no Curuá! Vou botar os índios contra o Ibama e se abusar vou tirar as maquinas também!”
“- Meu Deus, pensei! O que estou fazendo aqui? No meio desses malucos, vou cair no cacete também e olha lá se não vou perder também o meu avião!
E lá ia eu voando rumo ao Rio Curuá, de cabeça baixa pensando na fria em que estava, quando entrou na fonia o piloto do Machadinho, num Sêneca, vindo de Altamira para mesma pista em que eu ia pousar!
Comecei uma conversa mole tentando saber com quem ele estava, quando ouvi alguém mandando ele desligar o radio imediatamente, o que foi feito!
Na mesma hora, deduzi que seus passageiros eram da Polícia Federal, e, alertando o Nelson, disse-lhe para que dessistisse pois seu plano não ia dar certo, e iríamos acabar presos!
Ele pensou por um momento e disse: “- Vamos então pegar os outros na beira do Rio Iriri”!
Moço, como fiquei aliviado!
O piloto do Machadinho, outro dia, após a Polícia Federal ter preso um madeireiro junto com sua esposa em uma pista perto do rio Xingu, teve uma pane no Sêneca e veio a falecer junto com o pessoal do Ibama e da Federal, só sobrevivendo o madeireiro e sua esposa, bem machucados!
A pista na beira do Rio Iriri não era apropriada para as operações e usávamos o final da estrada para pousar! Foi lá que meu amigo piloto da cidade de Gurupi quebrou o trem de pouso do Ipanema do Dodô, jogando semente, tão boa que era a estrada.
Nesta pista, resgatamos alguns e decolamos para a Canopus, onde havia uma bela pista, só que a melhor posição para decolar era à partir da casinha aonde morava uma família que ajudava a cuidar da pista, e sempre nos servia um cafezinho e onde, em algumas ocasiões, acabei preparando minhas refeições, em panela emprestada! Sinto saudades dessa família, tão bons eram para comigo!
Ao pousar, Nelson foi logo dizendo, para que eu ficasse de prontidão, enquanto ele ia até a vila, buscar os trabalhadores a serem resgatados, pedindo-me que não saísse do local “nem para ir no mato” (fazer necessidades fisiológicas)!
Parecia que ele estava adivinhando! Fui cumprimentar aquela família de amigos meus e tratei de dar uma espiada pelas panelas!
Minha amiga, como sempre, cantou o esperado:
“- Comandante, vou fazer um pratinho de comida para você, viu?
- Adivinhou minha amiga, pois estou com uma fome de leão, e sou capaz de comer qualquer coisa, até mesmo estanho derretido, se tiver!”
Já estava pelo meio do prato, quando escuto aquela zoeira vindo do lado da vila, e não é que era o Nelson com os dois amigos, gritando desesperado:
“- Vamos embora Comandante, que os homem estão atrás de nós, larga desse prato e pegue no manche, pelo amor de Deus!”
Aquilo me pegou tão desprevenido que eu não sabia se largava o prato e corria ou corria com o prato na mão! Mas, meus amigos, a fome era tão grande que optei por não largar o prato, e lá fui eu, correndo e tentando equilibrar o prato para não deixar cair nenhum grãozinho que fosse!
Pulei para dentro do CZC com o prato e tudo, e disse para o Nelson:
“- Segura este prato aí, mas não coma nada que já vou decolar! “
Saí “fervendo azeite”, e foi a conta de chegar no final da pista, manobrar e “arroxar as periquitas” como se diz na gíria da aviação, e a Polícia Federal chegar! Dei um raso em cima deles, achando que iam mesmo atirar no avião, e até hoje agradeço ao bom juízo dos policiais!
“- E agora, Nelson pegue no manche e voe que vou terminar meu almoço em paz.
E foi assim que passei mais um dia de sufoco, tentando ganhar a minha vida como piloto, porém eu jurava que um dia iria parar de voar, só que este dia ainda estava longe.
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