Não pensem vocês que vou falar agora sobre o presidente Lula só por causa do título acima! Vou falar sim, porém em outra história. Hoje vou falar sobre outro presidente, o da comissão invasora da Mineração Canopus.
Para quem não conhece a região, a Canopus era uma área de mineração que foi abandonada, da Rhodia, multinacional francesa que por uns 10 anos extraiu grande quantidade de cassiterita e, por causa de sua proximidade do rio Iriri e mais ou menos uns 150km do rio Xingu, contribuiu para que muitas pessoas tivessem condições de entrar naquela área utilizando as estradas por ela construídas!
Esta região é sem dúvida nenhuma, uma das mais ricas do estado do Pará e, digo mais, até mesmo do Brasil, em razão de sítios minerais de altíssima produtividade ali existentes!
Não tenho dúvidas que ali, além da fertilidade do solo e dos índices pluviométricos girando em torno de 2800 milímetros de chuva, existe uma concentração de minério de gigantescas proporções, dando mesmo a entender que tudo aquilo, com certeza, é uma continuidade do filão mineral da serra dos Carajás.
Com todas estas riquezas juntas, só poderia acontecer o previsto: a invasão, que, na verdade, decorreu da falta de proteção do estado àquela reserva mineral sem precedentes!
Quando tomei conhecimento da invasão, populares e trabalhadores de São Felix do Xingu já tinham se dirigido para a área e estavam repartindo e marcando a posse das terras, com a finalidades variadas, de prospectar minérios e/ou montar fazendas de gado!
Fiquei com água na boca! Logo eu, que tinha vindo para Tucumã com a finalidade de me tornar fazendeiro, iria perder esta oportunidade? Nem morto, meu irmão! Tratei logo de dar meu jeito de ganhar um pedacinho de terra, acaso também não sou filho de Deus ?
Só que o problema era pousar pois, prevendo uma enxurrada de gente interessada nas terras, o presidente da Associação dos Invasores tratou logo de botar tambores na pista, para que ninguém se atrevesse a vir por via aérea!
A sorte, foi que eles haviam instalado um radio transmissor, que era usado para apoio e caso algum avião quisesse pousar, teria que ter autorização prévia do presidente, o todo poderoso Paixão!
Fiquei sabendo que um dos invasores era meu amigo e pedi-lhe que retirasse os tambores da pista no domingo seguinte, pois eu estaria lá levando um recado de sua família, o que acabou dando certo, e consegui meu salvo conduto.
No domingo cedinho, lá estava eu voando para Vila Canópolis como eles passaram a chamar o lugarejo, que mais tarde vim saber que seria Canopus. Não deixei de abastecer o avião de algumas garrafas cachaça da boa e algo mais que seria bem vindo por lá.
1hora e 40 minutos de vôo de Tucumã e, moço, só mato! Existia pouca abertura na mata naquela época. Durante o vôo ia pensando: teria que dar o meu jeito para entrar naquele racha a qualquer custo, só não tinha a menor idéia do que me esperava! E foi aí, meus amigos, que o destino me preparou mais uma grande aventura, que vocês logo conhecerão.
Vila Canópolis - região do Rio Iriri, no Sul do Estado do Pará !
Lá chegando, avistei a vila, pequena, em volta de uma imensidão de crateras e lagoas, herança da antiga mineração, pensei! Isto aqui é iqualzinho aos garimpos de Rondônia da onde vim fugindo da malaria que só aguentei duas e tinha certeza que a terceira iria me matar! Aquela situação de garimpo, era idêntica!
Ao procurar a pista, descobri com alegria, que tinha uns 1.000 metros , plaina, uma das melhores que já tinha visto na região, herança também da mineração, pois usavam-na demais na época das chuvas para tirar a cassiterita!
Foi neste local que meu parente João Segato trabalhou pelos anos 80 com sua família, isto uns 10 anos antes, o que me deixava a pensar que eles haviam passado tempos terríveis, ao imaginar que, naquele momento eu estava achando o local, um verdadeiro fim de mundo!
Na pista não havia nenhum tambor e pousei com segurança, estacionando ao lado de uma comitiva que ali me esperava, alguns armados, que levaram-me, para a sede. E aí meus amigos, foi aquele interrogatório, que só terminou quando meu amigo chegou, colocando-me a salvo!
“ - Que historia é esta Comandante? Que recado você veio me trazer?” Perguntou meu amigo.
- Não tem recado nenhum, fique tranqüilo pois só queria dar uma olhada por aqui. Não esqueci da sua pinga não!
- Afinal, quem é que manda por aqui?
- É o Paixão, um moreno gente boa! Só que ele não está aqui, foi para São Felix! Ele bem que está tentando controlar isto aqui, só que a coisa esta feia demais, tem muita gente e cada dia aparece mais, me parece mais um barril de pólvora pronto para explodir! Tome muito cuidado comandante!”
Tratei de armar minha rede, pois estava com muita vontade de não sair dali tão cedo. No dia seguinte, fiquei perambulando de barraco em barraco, tentando me enturmar e, com aquele bando desesperado, encontrei todo tipo gente, de policial a prostituta!
Como é interessante ver um bando de urubus em cima da carniça cada um tentando comer uma fatia maior! Para mim é a mesma coisa que acontece nestas invasões dos sem terra, só o governo e a igreja os vê de forma diferente, mas o motivo é sempre o mesmo, ganhar a terra para vende-la depois, e fazer um dinheirinho!
Lá pelo terceiro dia, conheci nada menos que, um irmão do Paixão, pessoa também importante na hierarquia dos invasores.
Não pensem que estou me excluindo deste julgamento, pois é muito interessante perceber como se muda, quando se propõe a participar de um movimento destes!
Aqueles princípios de respeitar o direito dos outros, as propriedades alheias, são as primeiras coisas que você joga no lixo, vai criando uma distorção dos mais sagrados princípios do ser humano, que até matar, para que o grupo atinja seu objetivos, torna-se normal! E aí eu vi o homem se tornar um verdadeiro animal. Só que animal mata para saciar a fome e o homem para saciar o desejo de posse.
Vendo ali a oportunidade de me aproximar do “Chefão” fui logo propondo levar seu irmão, que na verdade estava com uma baita malária, para São Felix, pois “imagine se ia deixá-lo morrer ali sem nenhuma assistência médica?” Negativo, meu avião estava a sua disposição, e também da associação! Claro que começava ali, minha oportunidade de conhecer o famoso Paixão! Não posso negar, que começamos, à partir daí, uma grande amizade.
Depois de muita conversa, já tinha garantido-lhe todo meu apoio em relação aos voos que precisasse e olhem meus amigos, que oferta boa essa minha! Vocês não tem a mínima idéia do que é andar por uma estrada, dentro da mata, cheia de buraco, atoleiro, o Rio Xingu para atravessar de balsa!
Graças a Deus nunca fiz esta viagem por terra pois, só para atingir a vila demorava de dois a três dias e só se sabia o dia da saída, dificilmente a data de chegada, era uma loucura! E olhem que eram apenas uns 150 kms de terras!
Passei uns dois dias em São Felix consolidando essa nova amizade.
“ - Paixão, você sabe que eu posso te dar todo apoio que vai precisar, tanto nos vôo, como para vender estas terras! Tenho muita gente interessada nelas e faço um trato com você: me arrume uns 1000 alqueires que prometo amarrar meu avião na pista e permanecer em Canópolis pelo tempo que você precisar.
A proposta, eu já sabia, era boa demais para ele pois, qual piloto se atreveria a brigar, dentro daquele barril de pólvora como dizia meu amigo, para ganhar um pedaço de terra? Na visão de meus colegas era um mal negócio, aquilo não valia nada, imaginem, ficar perdendo vôo na cidade?
Como eu tinha vindo para Tucumã com único objetivo de possuir umas terrinhas, agora era a oportunidade! E não deu outra, o Paixão acabou arranjando um grande parceiro: eu!
“ - Então comandante, esteja aqui na próxima semana que iremos para o Iriri.”
No dia marcado lá estava eu pousando em São Felix para levá-lo. Quando pousei, ele já estava me aguardando no aeroporto. Desci do avião e fui tomar um refrigerante, enquanto ele colocava a mala no bagageiro e, quando se despedia do irmão, bateu a mão na cintura e me disse:
“ - Oh, comandante, estou esquecendo meu revólver, você não se importa de me aguardar mais um pouco, que vou busca-lo? Ainda brinquei: “ - Meu pai me dizia que o revólver gosta de mandar o dono para a cadeia, deixa isto para lá Paixão.
- Não, eu não ando sem ele, disse-me. E sou bom no tiro também!”
Por mim tudo bem. Não demorou muito ele apareceu, mais confiante com seu 38 e, isto que é o mal: quem usa uma arma, passa a ter uma coragem exagerada, perde a capacidade de dialogar e acaba se metendo em encrencas só trazem grandes prejuízos e muito aborrecimento.
Decolamos, peguei a proa e fomos conversado, e não era que o rapaz tinha boas intenções? Seus planos para Canópolis eram na realidade, muito bons! Notei que ele seria um ótimo Presidente, pois, neste meio a gente só encontra bandido liderando um bando de aloprados.
Gastamos 1hora e 10 minutos para chegarmos, e foi só dar uma volta na pista, que já apareceu um bando de gente para dar as boas vinda para o Presidente.
Agora sim, eu estava me sentindo o Rei da cocada preta! Imaginem vocês eu junto com o Chefão? Não tinha mais dúvida que os meus 1000 alqueires, não estariam mais amarrados no rabo do veado, como se fala por aqui e sim no meu bolso.
Amarrei a maquina, e fomos para a vila, com gente carregando até minha bolsa! Como é bom ser importante num lugar como esse, até a sua vida esta protegida! Ninguém mexe com você!
Lá chegando Paixão foi logo dizendo:
“ - Comandante, vou mandar arrumar um quarto para você!
- Não precisa, respondi, vou armar minha rede no barraco do pessoal do Minhocão, porém venho jantar com você.
- Combinado então!”
Vila Canópolis
Fui descendo pela vila, vendo aquela bagunça, a mineradora tinha deixado a vila com uma infra-estrutura de fazer inveja. A rede elétrica já não tinha mais os fios, que foram retirados e vendidos, uma sala de laboratório estava toda depredada, que pena, pensei na malaria que certamente estava para chegar, deixando-me com medo!
As casas eram todas feitas de madeira estilo americano, após os 10 anos de uso ainda estavam em bom estado, os banheiros eram uma beleza, os primeiros que chegaram pegaram as casas que pertenceram à diretoria, existia até uma com piscina, enfim todas as outras casas também era muito boas!
E aí começaram as negociatas, quem pegou coisa melhor foi trocando, fazendo um dinheirinho e assim foi até acabarem com tudo que estava montado. Vi gente arrancando o vaso sanitário para vender! Se tivessem conservado a vila como estava, hoje Canópolis seria uma vila de dar inveja a qualquer lugar!
Infelizmente a falta de cultura de nosso povo, sem um mínimo de bom censo, nem recebendo de graça a vila, deram conta de preservar! Acabei assistindo a maior depredação urbana de minha vida, mesmo sabendo eles que tudo que estavam tirando, iria fazer falta mais tarde.
Até as antenas de radio foram saqueadas, os tratores, como não podiam carregar, tiravam peças e equipamentos e saiam vendendo! Meus amigos, um horror!
Arrumei um canto e amarrei minha rede, não esquecendo do mosquiteiro, pois a muriçoca era o que mais tinha. Existiam várias represas feitas pela mineradora que foram abandonadas cheias dágua! Não era preciso dizer, que, em breve, estaríamos dentro do maior foco de malária do mundo. Eu que o diga pois, mais tarde, tirei muita gente doente, quase morta, sem cobrar passagem, conforme era a praxe na época!
Á noite, dirigi-me para um hotelzinho, que possuía um motor estacionário para fornecimento de energia elétrica, sendo assim, a maioria dos habitantes por ali se encontrava, uns para beber, outros para conversar!
Nesta noite o ambiente estava tão cheio, que tinha gente sentada na calçada, e lá estava também o Presidente Paixão, de pé, conversando com o Paraibinha, um homem pequeno como eu, porem com fama de brabo! (mal dos baixinhos). Sentado na calçada, fiquei assistindo a conversa deles:
“- Paraibinha, você não vai cortar mais terras, disse Paixão!
- Como não, Paixão! Nós já estamos de posse delas, já fizemos até as picadas. Eu e meu grupo não vamos abrir mão, de jeito nenhum!
- Não senhor! Vocês já pegaram muita terra, e tem que entender que ainda tem muita gente que não recebeu nada. A coisa tem que ser mais justa, seu grupo já demarcou mais de 3000 alqueires e eu vou para lá amanhã consertar aquilo!
- Então senhor presidente nós vamos nos encontrar por lá e para nos acertar ouviu bem?
Olhei para o Paixão, seus olhos pareciam que soltavam faíscas, sua mão direita seguindo para a cintura! Pensei: o danado está armado, senti que a coisa estava ficando preta quando, de repente, ele deu dois passos para trás, e foi logo dizendo:
“ - Não senhor, Paraibinha! "Nóis" não precisa se encontrar por lá para acertar as nossas contas! Vamos nos acertar é aqui e agora mesmo!” E sacou do revolver, dando dois tiros à queima roupa!
Meus amigos, aí sim, vi gente correndo, e eu mesmo tratei de ir para a cozinha, e, de lá botei a cara para fora, e fiquei vendo meu amigo com o revólver na mão, dizendo para todo mundo ouvir:
“ - Não entra não, pois se entrar morre também!” E foi se afastando devagar, até desaparecer na escuridão da noite!
O que fazer?. Só via gente correndo para todos os lados, gritando:
“ - Pega o homem, pega o homem!” Enquanto outros gritavam: “- Chama o sargento, vão avisar o sargento, pelo amor de Deus”.
Aproximei-me do Paraibinha caído ao chão, e constatei que os tiros foram certeiros! Ele estava morto! Pensei comigo: “ - Não é que o cabra era bom mesmo com o revolver?”.
O corpo foi logo retirado dali e levado para a casa ao lado, para ser velado. Sentei em um banco e comecei a pensar: Que tragédia! Momentos antes eu estava me sentindo o rei da cocada, e agora estava lá triste e, principalmente, imaginando-me sem meu protetor!
Senti que tudo estava perdido! Todo aquele tempo gasto com Paixão tinha sido jogado no lixo e quem iria me ajudar a conseguir os “meus 1000 alqueires”? Tratei de ir para minha rede, pois só restava agora, dormir. A merda já tinha sido feita!
Quando cheguei no barraco, encontrei um bando de gente, todos ainda atônicos, e ouvi uma porção de explicações, para o que iria acontecer dali para frente. Uns diziam que naquele momento ele já estaria longe, outros, que estaria escondido no mato, próximo dali. Eu mesmo já tinha minha opinião.
“ - Eu vou dizer uma coisa para vocês, disse o sargento (reformado e que agora também tinha a profissão de garimpeiro): amanhã pela manhã vou reunir o meu grupo, (Paraibinha fazia parte), vou atrás desse cabra e se pegar, vou matar este desgraçado, vocês vão ver só!”
Eu estava sentado na minha rede, apreciando aquela valentia e pensava comigo mesmo: Já vi muita gente correr do urro da onça, sem antes a ter visto! Será que este é um deles? Como a conversa parecia que não ia ter fim, tratei de dormir.
Meus amigos, não se passaram umas duas horas, quando ouvi uma voz me chamando:
“ - Comandante, Comandante, acorda é o Levino!.
- Já vou, respondi.” Vesti as calça e o atendi.
“ - Comandante, quero ter um particular com você, vamos lá pra fora.
- Vamos!” respondi, e naquele momento pressenti o baita problema que me aguardava.
“ - O negócio é o seguinte: O Paixão está escondido dentro do seu avião, e vai passar a noite lá, ele quer que você vá amanhã bem cedinho para a pista, escute bem, somente você e ninguém mais! Ele mata você e qualquer outra pessoa que estiver contigo! Escutou bem, Comandante?”
- Não precisa dizer duas vezes que já entendi. Diga a ele que amanha no romper do dia estarei lá, dou minha palavra!”
Voltei para o barraco e imaginem quem estava esperando-me na porta? O Sargento:
“- O que aconteceu? Foi logo me perguntando, notando que sua curiosidade era grande.
- Você não quer pegar o homem, heim? Ele está na pista, dentro do avião, vai lá!”
Vocês já viram alguém engolir caroço? Pois como se diz por aqui, aquele sargento engoliu.
“- E tem mais, ele quer que eu vá lá de manhãzinha, para o tirar daqui!
- Não senhor, você não vai fazer isto! É contra a lei dar cobertura a um criminoso você sabe disso, e eu o denunciarei! E tem mais você tem que tirar o morto primeiro.
- Como não, sargento? Você quer que ele mande alguém vir me buscar? Na marra? Esta fácil agora! Vocês vão lá e pegam o cabra! Eu estou lhe dizendo onde ele está!
- Pergunto eu, você foi?” E foi aí que constatei que o Paixão era mesmo temido e respeitado.
- Vou te avisar uma coisa, sargento, vou cumprir a palavra que dei a ele, e vou dar a minha palavra a você: Volto aqui e tiro o morto também, é isto é que vou fazer! E boa noite, que vou dormir! Ou pelo menos tentar dormir!
Levantei cedo, mochila nas costas, e parti sozinho para a pista, pois,nesta hora, ninguém quis ir comigo.
Quando cheguei perto, já fui gritando:”- Paixão, oi Paixão, sou eu Niltinho.
- Está sozinho?
- Estou! Aí ele apareceu com o revolver na mão.
- Bom dia, Paixão.
- Bom dia”.
Olhei para ele, notei que estava calmo, parecia que não havia acontecido nada, pensei comigo, ele é muito tranqüilo, não deve ser a primeira vez.
“- Prá onde você quer ir? Perguntei calmamente.
- Quero que você me deixe na fazenda de um amigo meu, não muito longe do rio Xingu.
- Você conhece bem a Pista, Paixão?
- Conheço, porém ela esta um pouco abandonada, mas dá para descer.”
Enquanto conversava, ia tirando as estacas, verificando o óleo, drenando o avião, enfim fazendo aquilo tudo que se faz antes de voar, quando ele me disse:
“- Vamos logo com isto comandante, tenho pressa de sair daqui, já demorei demais pelo meu gosto”.
Como sempre, o tempo na Canópolis amanhecia fechado mas, dizer a ele que não era hora para decolar, nem pensar, só me restava saber se aonde iria pousar haveria tempo limpo!
Funcionei o avião e fomos para a cabeceira da pista. Juro que ninguém mais me obrigaria a decolar naquelas condições de tempo, que levaria, no mínimo, umas duas horas para abrir parcialmente.
Não deu outra tirei o avião do chão já entramos em vôo por instrumento, peguei a proa de São Felix, e fui subindo até atingir 4000 pés quando entrei em vôo visual, observando, logo abaixo, aquele tapetão que se perdia de vista! Neste instante, pensei: é hoje Niltinho, se prepara!
Olhei para Paixão e percebi que estava tenso! Na verdade não o conhecia bem a ponto de ter certeza que não me encontrava agora, na mão de um doido, mas, naquele momento, a única saída que tinha, era confiar em Deus! Assim sendo, iniciei uma conversa, para tentar quebrar o gelo:
“- Paixão, você poderia me dizer porque você matou aquele homem?
- Você acha que eu deveria deixar ele me “jantar”, sabendo o quanto ele é perigoso? Não! Tratei logo de “almoçá-lo”! Você não acha que estou certo, Niltinho?
- É Paixão, você esta certo!” Como iria discordar?
“- E agora, como fica a nossa situação?
- Sinto muito comandante, nem sempre a gente consegue o que quer, a vida é assim, um dia a gente ganha outro a gente perde, mas, não fique preocupado que você ainda vai conseguir o que deseja. Sinto que você é obstinado por terra, e vai possuir muita, não se preocupe com isto! O que aconteceu, foi apenas uma fatalidade!”
Aquelas palavras me serviram de consolo e aí, vi que não estava na mão de um doido e sim de alguém de bom senso que, infelizmente, portava um maldito revolver. Pensei então, no meu velho pai, que dizia que “o revolver gosta de levar o dono para cadeia”, o que era uma grande verdade!
Talvez, se naquele fatídico dia, ele não tivesse voltado para buscar a arma, a historia seria outra, para todos nós! “Maktub”, ou, traduzindo, assim estava escrito!
Consultei o relógio e disse:
“ - Paixão, devemos estar perto do rio Xingu, não acredito que vamos encontrar a fazenda, olhe bem, esta tudo fechado, se eu tentar furar esta camada, corremos o risco de bater em algum morro, escolhe outro lugar, que aí não vai dar mesmo! Não é que eu não queira pousar ali, é que não dava mesmo, insisti!
Ele olhava, olhava, até que finalmente me deu razão, porém, acabei notando que talvez ele tivesse alguém a esperá-lo por ali !
“ - Vamos então para São Felix mesmo, comandante.”
Dali para frente apareceram uns buraco na camada fechada, e percebi que dava para passar para baixo, o que fiz, saindo em cima do rio Xingu, que acabei seguindo até nosso destino!
“- Niltinho, você vai fazer o seguinte: pouse daqui para lá e pare no final da pista que vou descer lá!
- Fica bom para você, Paixão?
- Fica.”
Fiz o que ele pediu e quando parei o avião, ele abriu a porta, pegou na minha mão, olhou bem nos meus olhos e disse:
“ - Desculpe-me, e cuide-se, irmão!”
Senti um nó na garganta e respondi:
“ – Cuide-se você também, o que precisar de mim, estou às ordens!” Foi a última vez que o vi! Mais tarde soube que tinha fugido para o Goiás e acabou preso!
Abasteci novamente o CZC, e tratei de voltar para buscar o morto que estava esperando, e cumprir a promessa que fiz ao Sargento! O defunto, eu fui deixar na numa localidade logo ali perto, recebido que foi com aquela choradeira, parecia que tinha morrido um santo.
E foi assim meus amigos, que terminou minha primeira tentativa de possuir terras na região do Iriri. Não pensem, no entanto, que tinha desistido, foi apenas a primeira tentativa, de outras que por ali vieram!
Comandante Niltinho
É piloto de garimpo
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